segunda-feira, 12 de novembro de 2012

-- 24 horas Hospício --



Introdução
Ela passava novamente por uma daquelas fases filosóficas, se perguntando qual o sentido da vida, e pq continuava a correr atrás das coisas. Só que essa fase veio com um agravante, ela se perdeu nos seus objetivos, então mesmo não sabendo pq, é importante ter um objetivo na vida, e no meio do caminho ela havia perdido seu preciso e fundamental objetivo.
Ela havia elaborado fazia tempo uma espécie de fuga da realidade que ela autodenominava de “coma induzido”, que consistia em tomar uma super dose de remédio para dormir e simplesmente apagar durante um tempo, nessa teoria chegou a ficar mais de três dias, literalmente apagada.
Depois de sair do emprego, sempre em busca de algo melhor, que a levasse perto de seu até então, “objetivo frustrado”, ela começou a ficar mais em casa, e começou a recorrer  com mais frequência o “coma induzido”. Com o tempo, a medicação não fazia mais efeito, e ela tinha que tomar cada vez mais do mesmo remédio e conseguia dormir cada vez menos. Então, sem escolha, não conseguiria mais fugir da realidade, teve que procurar ajuda.
Filme: "Number 23"


Ajuda
Ela foi em busca da cura, não só da dependência do medicamento, mas também do “desejo de fuga”. Como não tinha plano de saúde e estava desempregada precisou procurar pelo SUS, que agendou uma consulta com um clínico geral para depois encaminhá-la para o psiquiatra. Durante a consulta em 07/11/2012, ela teve que ela teve que expor os “pq’s” conseguir tal encaminhamento. Foi relativamente bem atendida, pq além de conseguir entrar para a fila de cirurgia bariátrica (sim, ela estava acima do peso), ela foi encaminhada para internamento 24 horas, pedido urgente, para um dos hospitais psiquiátricos da cidade.
No final da consulta ela estava lá, sentada sozinha, chorando, por descobrir que estava muito mais gorda e louca do que poderia imaginar.


O internamento
Precisaria de alguém para acompanhá-la ao hospital para autorizar o internamento e futura alta. Conseguiu uma pessoa, passou em casa, pegou algumas peças de roupas e produtos de higiene pessoal, livros, etc... e foi para o hospital.
Foi muito bem atendida por uma psiquiatra, embora, ela ainda suspeitava que todos eles achavam que era “tentativa de suicídio” o que ela chamava de ‘coma induzido’, mas NÃO ERA.
Enfim, analisaram o caso e encaminharam para internamento, metade das coisas que ela havia levado na mochila não puderam entrar, como livros, canetas, até os óculos de grau ela teve que evitar entrar com ele.
Explicaram para ela que muitas daquelas coisas poderiam ser utilizadas como “armas” para outras pacientes, que poderiam usar contra elas mesma ou contra as outras pacientes. Naquele momento, ela ficou assustada, mas continuou com o processo,certa de que seria eficiente e que precisava ser forte, deixou o acompanhante na enfermaria e foi encaminhada para enfermaria, onde fiquei quase uma hora esperando para ir para o pátio com as outras internas.



As Internas (detentas) / Pátios e Leitos (cadeia)
Sim, não sei se era o seu subconsciente funcionando, ou a estrutura do prédio que remetia a isto, quando entrou, se sentiu entrando em uma cadeia, dessas antigas, de filmes.
Ela já havia estudado algumas coisas sobre psicologia, então, na teoria, já sabia o que a psicose, a bipolaridade (sim ela existe), depressão, a crise de abstinência de algumas pacientes, ex usuárias e drogas, causavam, mas, ao vivo e a cores, foi assustador.
Ela não queria criticar o sistema de saúde mental do estado, mas achava que talvez o internamento devesse ser separado por alas, para pacientes mais descontrolados com psicose e outra ala para depressivos, enfim, é uma idéia. Achava que desta forma o tratamento seria mais tranqüilo.
Entrando no pátio, um jardim mal cuidado, com alguns bancos, um banheiro e alguns balanços para adultos, ela foi recebida por algumas pacientes que estavam mais “conscientes”. Conheceu duas internas que só estavam ali fugindo da justiça, uma por roubo(algo assim), outra por crime de trânsito, alegavam bipolaridade, depressão, estavam tentando burlar o sistema.

Conheceu Ana, a pessoa mais doce do mundo, que estava ali por depressão pós parto ou por erro na aplicação de medicamentos no hospital onde ela havia ganhado bebê, ela e Ana acabaram se apegando bastante uma a outra, ela ajudava Ana com o básico, a se mover, comer, andar, tomar banho. Ana o tempo todo chamava por deus e o nome de sua filhinha. Era de fato, de cortar o coração, pq sabemos que um não iria responder pq não existe, e a outra, estava longe e na sabia falar.
Mesmo sendo ateísta, ela teve que conviver com pessoas que não tinham mais motivos pra acreditar em ‘deus’, pq chamavam e não eram ouvidas, mas talvez até por falta de raciocínio lógico, elas ainda esperam que deus respondesse.
Ela começou a observar as pacientes:
Uma bipolar, e só ali, ela foi conhecer uma verdadeira bipolar, não essa modinha adolescente, que te amava em um minuto e no outro queria te bater.
Uma velhinha bem agressiva, (a lembrou sua vó falecida), uma outra velhinha que achava que era criança, o tempo todo com uma boneca na mão.
Uma que não conseguia falar e não ficava de roupa de forma alguma, as enfermeiras o tempo todo, colocavam roupas nela, passava minutos ela estava pelada de novo.
Filme: Garota Interrompida
Vi uma paciente com uma sacola na cabeça e perguntei pq, ela estava com remédio para piolhos. No dia seguinte uma outra paciente que tinha as cabelos longos, estava com o cabelo curto muito mal cortado, enfim, o medo que ela tinha de piolhos, quase superou o horror do restante que ela via (fútil não?).
Haviam pacientes que defecavam na roupa sentadas ao lado dela, ela só percebia quando o cheiro se tornava insuportável e saia de perto para chamar uma enfermeira para cuidar da paciente.
No mais, eram gritos, quase o tempo todo, o tempo todo alguém se debatendo, tentando se matar com o sutiã, com a blusa. Durante o dia não podiam dormir, tinham que ficar o tempo todo acordadas.
O que fazer o dia todo, além de acompanhar a movimentação das pacientes em crise? Assistir TV, ligada o tempo todo na Globo, durante essas 24 horas assistiu duas tentativas que eles chamam de terapia, uma de fazer um horta e a tal da musicoterapia.
Ela não era médica, mas não achava que essas atividades serviam para acalmar as pacientes durante alguns momentos e só. Então, ela começou a concluir que o tratamento psiquiátrico não passava de medicamento e controle dos ataques, não sabia mais, se de fato alguém saís curado dali ou sem tomar mais remédios do que entraram tomando.
A comida, diziam que não era ruim, mas ela sempre foi muito enjoada para comer, achou péssima, não comeu quase nada nestas 24 horas. Se tivesse ficado mais tempo, talvez saísse da fila de cirurgia bariátrica.



Noite
A noite de 07 para 08/11/2012, para quem morava sozinha, tomava remédio, só conseguia dormir em silêncio e escuridão total, a noite foi ‘torturosamente’ longa. Ele escondeu a sapatilha embaixo do colchão, recomendação de outras pacientes, alegando que se não fizesse isso, a sapatilha iria desaparecer, pq durante a noite, outras pacientes poderiam pegar e nunca mais ela a veria de volta. Viu uma das pacientes (a bipolar) sendo amarrada na cama, ela se recusava a tomar medicação e era uma das mais agressivas. Só conseguiu dormir umas três horas, além da luz, ecoava pelos corredores brancos  entre os leitos os berros de alguém tendo uma crise.
Depois desta noite mal dormida e continuar tendo que conviver com pessoas gritando o tempo todo, percebeu que de fato iria enlouquecer, então resolveu pedir para que o responsável por ela pedisse alta (só ele poderia fazer isso).





O Psicólogo
Quando o psicólogo chegou, a encontrou juntamente com a Ana sentadas num cantinho. A chamou para conversar, é padrão para novas pacientes. Ele fez as perguntas de sempre, questionou o pq dos profissionais e até pq ela mesma havia optado por tal tipo de tratamento (internamento 24 horas). Desta conversa, ela chegou a conclusão de que foi apenas mais uma tentativa de fugir da realidade, visto que ‘seu coma induzido’ já não funcionava. Ele terminou a sessão com perguntas e não com respostas, como ela esperava, depois de falarem sobre toda a frustração que ela estava vivendo, ele a questionou? Se não agüenta ficar aqui dentro, se ela agüentaria a realidade lá fora? Ela retrucou dizendo que a realidade lá fora era muito diferente daqui. Ele terminou a sessão com uma pergunta simples... “é?”. (são mesmo diferentes, as realidades?)
American Horror History
A decisão
Mesmo sendo questionada pelo psicólogo, resolveu pedir alta, estava de fato enlouquecendo ali. A assistente social chegou a falar para o seu acompanhante que ali não era lugar pra ela, pq ela estava lúcida. E se você não estudou e se preparou muito para isto, é quase impossível conviver com esse tipo de situação 24 horas por dia e não “enlouquecer”.
Sim, ela achava que no mínimo tiraria desta experiência, aquele velho clichê, de que tem gente pior que ela, mas como o psicólogo disse, esqueça os outros, não é pq não estão bem que você esteja.
A conclusão que chegou, foi que não queria voltar para um lugar daqueles, sem opção de alta a pedido e que iria rever a utilização do medicamento, iria rever do que de fato está fugindo, mudando de cidade, dormindo, se internando, iria tentar tratamento com psicólogo/psiquiatra.
Filme: Garota Interrompida
Não saiu de lá, com uma grande mudança de vida, no final das 24 horas, ao atravessar os portões, seus problemas estavam a esperando, a realidade continuava dura e as vezes assustadora, mas ao menos sabia o que não queria.


P.S. Ela espera que a Ana esteja bem, espera um dia encontrá-la com a filhinha no colo.

6 comentários:

  1. Aposto que deve ser assim um hospital psiquiatrico. Publico.

    Interessante seu post.

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  2. Glicéria Dulce da Silva13 de novembro de 2012 às 12:59

    Estas palavras que vou escrever aqui, talvez vc não se lembre, mas vc disse pra mim um dia.
    "Filha! Com o tempo tudo se ajeita, seja forte, eu sei que vc já passou por muitas coisas, mas seja forte e não se entregue."
    Não exizte distância que nos separe, vc estará sempre aqui no meu pensamento e no meu coração. To aqui. Te amo muito minha filhota guerreira.
    Bjim de mamys

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  3. Chocada... Pode parecer piegas, mas se precisar falar com alguém que não espera mais nada tão brilhante assim da vida, tamo junto.

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